terça-feira, 31 de maio de 2016

Teoria e História: a liberdade multirreferenciada dentro das possibilidades de consolidação teórica

Teoria e História: a liberdade multirreferenciada dentro das possibilidades de consolidação teórica


Wilson Oliveira Badaró


            Discutir um assunto tão remoto quanto os próprios relatos da produtividade humana nos diferentes campos do saber dentro da história é uma tarefa bastante complicada. Associar correntes teóricas e metodologias, muitas vezes, díspares e anacrônicas – ainda que assim aparentem em um primeiro momento – em relação a realidade historicamente contextual de um objeto de estudos com tais implicações temporais é ainda mais complexo. Como aproximar discussões, conceitos, noções e teorias dos últimos dois séculos com qualquer sociedade histórica da antiguidade remota? Como evitar que as impressões atuais sejam transplantadas do presente para um passado tão singular e dinâmico em sua estrutura quanto o Egito Antigo? São indagações e problemas como estes que os aspirantes a historiador encaram em seus primeiros passos na produção acadêmica da pós-graduação.
            A escola positivista, apesar de tida e apresentada como obsoleta por muitos deve ser considerada pelo fato de haver lançado a pedra fundamental de uma produção histórica organizada e pautada em uma metodologia, ainda que problemática (aos nossos olhos hoje), bem definida e delineada. Sua teoria do reflexo, tão propagada por Ranke, representou um avanço para as escolas históricas de seu contexto e, o culto às fontes traz consigo uma espécie de redenção cientificista para os historiadores de então. Acreditou-se, dentro daquele momento da historiografia que “ao abandonar a influência da filosofia e pretender assumir uma forma científica, o conhecimento histórico aspira à objetividade” (REIS, 2004, p. 10).  Atualmente, podemos dizer que boa parte das tendências de produção historiográficas não estão totalmente livres desta tendência pois, basta você propor a um orientador uma pesquisa complicada que ouvirá em sequência a pergunta: “tem fontes?”. E de certo modo, precisamos convir que, escrever história sem referenciais materiais e documentais tangíveis transporta-nos quase que imediatamente à uma revisão de literatura. Enfim, acredito que o positivismo, neste sentido, ainda nos acompanha e se mantém altamente atual. Por isto, muitos se conformam com a noção e rotulação de neo-positivismo. Em meu trabalho sobre o Egito Antigo, dependi quase que exclusivamente de meus papiros para desenvolver discussões realmente relevantes sobre o assunto.
            Já na corrente marxista, as considerações teóricas que identificam contradições nas construções sociais em todo o mundo, sobretudo no mundo ocidental onde, a exploração do homem pelo homem amplia as diferenças e apontam para uma constante luta de classes que passou despercebida pelos positivistas que praticavam uma produção historiográfica de “classe para si”.Em meu trabalho, em específico, vejo a possibilidade de utilizar-me da noção de hegemonia e luta de classes do marxismo para explorar os silêncios da historiografia ocidental acerca da relevância das práticas de cura egípcias, assim como se propôs um saber medicinal hegemônico do ocidente sobre o resto do mundo desconsiderando os apontamentos de Gordon Childe[1] sobre a transmissão de saberes do Oriente Próximo para o ocidente.
            Uma leitura sobre as forças produtivas poderá aparecer no sentido de apresentar um quadro funcional da sociedade egípcia onde as atividades deem uma paisagem mais detalhada daquele contexto histórico. Neste ponto, podemos convir, de acordo com as noções de materialismo histórico e dialético do marxismo que dentro da ideia de
produzir, os homens se socializam e mudam com consciência a natureza. O homem gera, pela produção, novas necessidades e, consequentemente, o modo de consumo de seu produto, surgindo assim o seu consumidor.O modo, o consumo, a quantidade e a forma de satisfazer a produção são produtos históricos (QUINTANEIRO ET OLIVEIRA BARBOSA, 1995, p. 70; BADARÓ, 2010).
            Tais verificações materialistas e dialéticas entre homem e meio são fenômenos amplamente observados na lida das práticas de cura do Egito Antigo. Deste modo, o materialismo histórico é essencial para compreender processos sociais dentro das comunidades africanas antigas.
A luta de classes aparece como forma de compreender o não reconhecimento das potencialidades africanas no sentido de continuar legitimando uma partilha que se travestiu de missão salvacionista e progressista para um continente apresentado para o mundo como pecaminoso, subdesenvolvido, incréu e apolítico. Ou seja, muitas dimensões do marxismo podem dialogar amplamente com o meu trabalho, mas devo manter em foco as renovações propostas por Edward Palmer Thompson para atualizar as discussões em relação ao marxismo clássico.
            A interdisciplinaridade e a história problema fazem parte do meu projeto desde o princípio de sua concepção. Dialogar com a espacialidade, territorialidade e as dimensões limítrofes dos africanos em relação aos seus vizinhos internacionais – núbios, kushitas, meroítas e napatas, por exemplo – é conhecer as benesses da inclusão de discussões de outros campos de conhecimentos. Descrever esta territorialidade é compreender a necessidade da História compreender as contribuições da cartografia para uma apresentação histórica bem fundamentada. Braudel já propunha esta aliança, dentro das convicções da escola dos Annalescomo solução plausível para a complementariedade da ótica histórica acerca das complexidades que cercam as discussões das ciências ditas sociais.
            Deste modo, a escolas de Annales contribui poderosamente no sentido de ampliar as discussões pela proposição acertada destes historiadores no sentido de rever as discussões, antes muito endógenas entre os pares produtores de conhecimentos historiográficos, e incluir em seus debates matérias de outros campos de conhecimentos.
            Dentro desta corrente, vejo ainda a leitura bastante contributiva da longa duração dos processos e intervenções de cura dos egípcios, partindo dos pressupostos de Braudel. O pergaminho que me conduz a esta discussão fora produzido por entre 2700 a.C e 2500 a. C, em hieroglífico, contudo, a versão que disponho, em sua forma digitalizada, está em hierático e pressupõe uma cópia para projeção dos conhecimentos, além de, possivelmente, tratar-se de uma cópia de segurança visando a perpetuação destes saberes.
            Como se pode ver, todas as três correntes contribuem efetivamente para a construção deste trabalho, no entanto, nenhuma, isoladamente, terá impacto realmente significativo na produção. O ideal é o uso consciente e ponderado dos referenciais, justificando suas inclusões e usos para uma base realmente científica e verificável.
Bibliografia
CASTRO, Ana Maria de; DIAS, Edmundo Fernandes.Introdução ao pensamento sociológico.18. Ed. São Paulo, Centauro, 2005.
CHILDE, V. G.A evolução cultural do homem. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978.
OLIVEIRA BARBOSA, Maria Ligia deQUINTANEIRO, Tânia.Um toque de clássicos: Durkheim, Marx e Weber.Belo Horizonte: Editora UFMG, 1995.
REIS, J. C. A História, entre a Filosofia e a Ciência. 4. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.



[1]Para maiores discussões e detalhes, veja: CHILDE, V. G.A evolução cultural do homem. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Anti-negritude de gênero e o projeto brasileiro impossível: Estudo crítico dos negros brasileiros emergentes.

Anti-negritude de gênero e o projeto brasileiro impossível: Estudo crítico dos negros brasileiros emergentes.


João H. Costa Vargas [1]
Universidade do Texas em Austin, EUA
Traduzido por: Wilson Oliveira Badaró

Resumo
Uma nova geração de negros erudito-ativistas brasileiros está fazendo perguntas críticas sobre a natureza e o processo da política. Não mais restrita á dominação branca brasileira ou aos cânones e rituais acadêmicos eurocêntricos, essas vozes negras, enraizadas nos esforços coletivos voltados contra as onipresentes e persistentes práticas discriminatórias contra o gênero negro, desafiam a maquinaria cognitiva e política do mundo social. Sônia Santos, Jaime Alves, Luciane Rocha, e Maria Andrea Soares concentram-se em experiências negras que sempre revelam uma estrutura de antagonismos contra os negros. Suas análises sugerem que o caráter eminentemente corrupto do projeto social e ideológico brasileiro dominante. Se o projeto pode ser reformado, ou se deve ser destruído e substituído depende de como nós lemos e do quão longe estamos dispostos a levar cada análise.
Palavras-chave
Diáspora negra, Brasil, Anti-negritude de gênero, Violência
Sônia Santos, Jaime Alves, Luciane Rocha, e Maria Andrea Soares, os autores dos ensaios neste volume, fornecem percepções sugestivas sobre as experiências de gênero de negros e negritude no Brasil. Os escritos são convincentes por causa dos materiais etnográficos densos que eles apresentam e analisam. Assim, a importância destes ensaios reside na ladainha de proposições heurísticas, hipóteses, e projetos políticos e estéticos que geram. Eles falam da vida dos negros e morte social como fios misturados de geografias da diáspora. E eles adotam e elaboram a partir das posições aparentemente difíceis, se não impossíveis, de negritude gênero, revelando, assim, tanto cenários distópicos quanto cenários cautelosamente esperançosos. Estes ensaios são tanto sobre a sujeição negra, como são sobre objeção negra à sujeição (Moten, 2003).
Entre o não mais e o ainda não, preso neste momento incerto ainda que potencialmente transformativo, esta nova geração de negros erudito-ativistas brasileiros está fazendo perguntas críticas sobre a natureza e o processo da política. Não mais restrita á dominação branca brasileira ou aos cânones e rituais acadêmicos eurocêntricos, essas vozes negras, enraizadas nos esforços coletivos voltados contra as onipresentes e persistentes práticas discriminatórias contra o gênero negro, desafiam a maquinaria cognitiva e política do mundo social. Em diálogo com, e/ou opondo-se à instituições brasileiras e as premissas e práticas da sociedade civil, Santos, Alves, Rocha e Soares concentram-se em experiências negras que sempre revelam uma estrutura de antagonismos contra os negros. O mundo social negro é um mundo em guerra.
Esta nova geração constrói a partir das idéias de Abdias do Nascimento e Lélia Gonzalez, entre muitos outros críticos brasileiros negros. Embora esses autores emergentes se expressem em inglês e estejam profundamente imersos em várias correntes feministas de negros, eles desenvolvem um conjunto de estratégias analíticas que descentram as perspectivas anglófonas dominantes sobre a diáspora negra e sobre os feminismos negros. Baseando-se em material etnográfico reunido em e sobre as dinâmicas sociais negras brasileiras, que incidem especificamente sobre a saúde reprodutiva das mulheres negras, práticas de jovens negros que reclamam espacialidade urbana, experiências de violência de mães negras, e representação de negros e da negritude na cultura popular. No entanto, ao produzir um conjunto articulado de prementes conhecimentos, os escritores apontam para componentes relacionados com a fundação da política anti-negra. Embora nenhum dos autores digam explicitamente, suas análises sugerem o caráter corrupto imanente do projeto social e ideológico brasileiro dominante: a partir da perspectiva do afro-descendente, o Brasil é uma fraude. Se o projeto pode ser reformado, ou se deve ser destruído e substituído depende de como nós lemos e quão longe estamos dispostos a assumir cada análise.
Uma das experiências que os autores brasileiros negros neste volume têm em comum é a imersão e envolvimento ativo com as perspectivas da diáspora negra dentro e fora do Estado-nação brasileiro. Em vários graus identificados com a (bastante ostensivamente) auto-proclamada Escola de Estudos da Diáspora Negra de Austin (Gordon, 2006), Santos, Alves, Rocha e Soares habitam e de bom grado teorizam desde uma perspectiva estrangeira do ponto de vista, se eles se encontram no Brasil, nos Estados Unidos, ou em outro lugar. Indivíduos negros produzem elevada dissonância social, em espaços canônicos brancos da academia e da administração, incluindo eventos custeados por iniciativas governamentais e não governamentais, universidades, conferências e fóruns públicos bem conceituados. As variações de gênero, cor e classe social impactam no nível de dissonância. Ao nível da análise, a qualidade dissonante de pontos de vista dos autores significa que suas obras ainda não são aceitas como representações legítimas dos processos brasileiros e da diáspora negra. No Brasil e nos Estados Unidos, embora esses autores estejam sempre sob a suspeita que é lançada sobre qualquer intelectual negro, a suspeita de que a experiência é agravado pela sua transnacionalidade. Tudo isso é para dizer que, enquanto o 'não mais' for certamente palpável, o "ainda não" sugere um cenário de integração e respeito que é, na melhor das hipóteses, um tiro no escuro. As experiências profissionais dos autores são elas próprios a evidência de uma estrutura diaspórica de disposições contra os negros. Para tornar as coisas ainda mais complexas e aguerridas, é bastante evidente que os não-negros não decretem tais disposições exclusivamente contra os negros.
Santos, Alves, Rocha e Soares recusam-se a perguntar ao absolutamente mal informado, vinculado com a má fé, e francamente pergunta irresponsável sobre se a antinegritude de gênero é relevante. Em vez disso, os autores desta edição especial, diretamente ou por implicação, consultam: como é que a antinegritude de gênero se manifesta em práticas da sociedade civil e do Estado? Esta importante questão leva a, investigação crítica fundamental: se as polis brasileiras podem integrar os negros? Especulando ao longo destas linhas, pode-se propor: se a polis não é capaz de integrar os negros como de facto, cidadãos de pleno direito e, em seguida, se a polis, do ponto de vista negro, se são projeto e eventos impossíveis. Os chronos de integração – o tempo decorrido, tempo imaginado, o tempo experienciado – é um chronos impossível. Sucede que o sujeito negro de gênero é um tema impossível, aquele cujo gênero impossível, negritude impossível, ser impossível, habita as muito impossíveis coordenadas de tempo e espaço que compõem a nação possível. A nação é possível porque o sujeito do gênero negro, enquanto sujeito, enquanto cidadão, é um oximoro. Sempre já[1], assim eterna, portanto, fora da linearidade do tempo, o sujeito negro impossível ocupa as zonas de morte. Não é por acaso que, em Santos, Alves, Rocha, e os escritos de Soares, a morte é um evento tão importante – sempre presente como uma possibilidade, como experiência, como representação, como a repetição, quase banal. Que nós, às vezes, tornamo-nos ainda enfurecidos pela morte aparentemente desnecessária de uma pessoa negra – apesar de que seria um exagero dizer que estamos surpresos – sugere que, de algum poderoso, embora nem sempre em formas transparentes, negros esperam pela aceitação e inclusão. Se as aceitação e inclusão são metas atingíveis e realistas dependem de uma posição sobre antinegritude: é destrutível, ou pelo menos controlável? E se sim, como? E quem pode e deve ser envolvido no processo?
Para se envolver com essas questões temos de atravessar camadas grossas e profundas de uma máquina cognitiva dominante que sugere um cenário fundamentalmente divergente, estruturado em torno de um conjunto de narrativas relacionadas e hegemônicas: a nação brasileira abrange tudo; racismo anti-negro, quando e se existir, pode ser, será, e já está diminuindo, e o atual boom econômico, gerido pelos competentes, incomumente populares administradores de esquerda (presidentes Lula e Dilma Rousseff paradigmaticamente simbolizando o momento) vai levantar todos os barcos, incluindo aquele dos afro-descendentes. Tal aparato cognitivo expressa e reafirma uma ontologia mítica que acolhe a negritude, aceita, procura, e já incorpora a miscigenação e a harmonia social. O sobre-humano todo-amoroso, cósmico, figura social confiante que encarna esta máquina ideológica é um cyborg. Este cyborg exige e decreta a eliminação mágica de negros – mágico porque a eliminação é apresentado como seu exato oposto: amálgama tão benevolente. Este cyborg, tão sedutor quanto parece, precisa ser destruído, porque o seu desejo de mistura, como Abdias do Nascimento diria, é uma tecnologia de massacre. O projeto nacional otimista e sua ontologia atendente, eu ouço os autores neste volume sugerindo, são enganosos na medida em que consistentemente produzem morte social negra.
Nos ensaios que se seguem, as intersecções entre negritude de gênero e geografias controvertidas são uma chave para o desafio analítico. O reconhecimento de que esses cruzamentos estão no cerne de uma condição diaspórica negra e seu processo – o da aguerrida presença negra em Estados-nação das Américas – figura proeminente em cada uma das explorações dos autores das restrições políticas e possibilidades relativas às cidades mundiais brasileiras. Conforme análise de representações visuais da negritude indica, falar da presença negra aguerrida é se envolver com o olhar branco dominante. Um olhar que exige controle, distância, separação. Um olhar que é ameaçado com a perspectiva de ser visto, o que significa a perspectiva de ter seu ponto de vista desafiado, seus privilégios questionados, sua pureza negada. Com base na análise da ontologia negra (1967: 110) de Frantz Fanon, podemos supor que o corpo negro de gênero deve ser de gênero e negro em relação ao olhar branco (ele mesmo sempre já de gênero e racial). O inverso, porém, não é verdade. No caso do corpo negro como gênero masculino, Fanon conclui que "[o] homem negro não tem resistência ontológica nos olhos do homem branco". Em outras palavras, o olhar branco, e o ser de gênero branco, não é dependente do olhar negro. Na verdade, o olhar branco e, portanto, o ser branco, depende do pressuposto de que, ao mesmo tempo que vê, captura e coisifica – 'Olhe, um negro[/negra]' – é protegido contra a negritude.
Os ensaios de Santos, Alves, Rocha e Soares engajam um problema persistente que afeta a sociedade brasileira: qual é o lugar de negros e negritude no imaginário nacionais, arenas políticas e paisagens urbanas? Embora possa haver um lugar para a negritude nos reinos da representação e da atuação (por exemplo, como ritual, como o consumo, como o medo, como desejo, como oposto ontológico), às vezes celebrada, às vezes negada, muitas vezes ambos, a pergunta sobre o lugar dos negros – como corpos, comunidades e terra – é complexa, e porque nos convida a lutar com os resultados reais das representações e práticas sociais, talvez mais urgentes.
A distinção entre a negritude e negros é, naturalmente, uma estratégia analítica que tem pouca analogia com a experiência: seria um desafio para identificar a manifestação de um sem o impacto do outro. Ênfase na divisão, no entanto, permite um exame nacional de uma contradição fundadora das relações sociais brasileiras e representações, ou seja, a negação simultânea da relevância da raça em geral, e em particular da negritude, e da hiperconsciência de raça, e negritude especificamente, como parâmetros normativos dos quais o comportamento, representações, e os arranjos institucionais desenham.

Análise Relacional da antinegritude de gênero


Numa perspectiva diaspórica negra, a gramática de estruturas antinegritude, os mundos sociais e cognitivos em formas que permitem paralelos, conexões e analogias entre fronteiras de tempo e geografia (Barlow, 2003; Harrison 2002; Robinson, 2000; Winant, 2001). No caso específico de estudos críticos sobre as relações sociais brasileiras, Angela Gilliam (2001), Michael Hanchard (2003), Sonia Santos (2008), Keisha-Khan Perry (2009), Jaime Alves (2009), e Luciane Rocha (2010), entre outros, têm enfatizado suas semelhanças vis-à-vis outras nações e estados de império (Jung, 2011), ao invés do caráter sui generis da arquitetura social brasileira comumente assumida. Isto não é para negar especificidades das relações sociais brasileiras, mas sim, é para analisar essas características únicas no contexto de uma antinegritude diaspórica primordial que estrutura mundos sociais, em particular, ainda costumes relacionados. Um olhar sobre os indicadores econômicos e sociais oficiais, nos Estados Unidos e no Brasil, é suficiente para concluir que, inflexões locais, não obstante, em ambos os lugares oportunidades de vida nas esferas do trabalho, habitação, justiça criminal e de saúde estão relacionados à própria posicionalidade racial (Paixão, 2010; Telles, 2006; Winant, 2001), e que o mais próximo é/está para a negritude, com variações de acordo com as formas que o gênero se articula com a raça, maior o nível de desvantagens. Maiores disparidades existem entre negros e não-negros, mais do que dentro dos grupos raciais, um padrão indicativo de uma estrutura antinegra diaspórica de antagonismo racial de gênero (Harrison 2002; Hartman, 1997, 2007; Wilderson 2010). Explorando as implicações de uma perspectiva diaspórica que centraliza a antinegritude, Jared Sexton (2010: 47) escreve:
Se a opressão dos povos não-negros de cor em, e talvez além, os Estados Unidos parecem condicional para as instâncias históricas e funções em um escopo empírico mais restrito, a antinegritude parece invariante e ilimitada (o que não significa que o primeiro é de alguma forma insignificante e de curta duração ou que o último é desgastante e imutável). Se perseguido com alguma consistência, o tipo de análise comparativa descrita acima, provavelmente afeta a formulação da estratégia política e modifica o comportamento da nossa cultura política. Na verdade, pode desnaturar o instinto comparativo, em favor de uma análise relacional mais adequada para a tarefa.
Variações de uma estrutura de análise relacional Santos, Alves, Rocha, e os ensaios de Soares. A análise relacional constrói a partir de fatos da negritude de gênero transnacional e examina suas manifestações locais. Destacando a negritude, esta perspectiva especifica a supremacia branca, tornando-se um discurso histórico de poder que depende da associação entre negritude, por um lado, e não humanidade, exclusão, aversão, por outro. Ao refletir sobre a constituição e os efeitos das hierarquias de gênero brancas supremacistas raciais, a negritude e os corpos negros ganham relevância central – não total – como demarcação de zonas de morte a partir do qual os grupos dominantes e subordinados são constituídos (Sexton, 2010: 48). O continuum da supremacia branca de relativa pertença torna-se um continuum que salienta a exclusão negra como a exclusão paradigmática. Um campo de continuidades, mais do que rupturas, define a diáspora negra e seus estados-nação.
Como os ensaios de Santos e Rocha mais incisivamente observam, os aspectos de gênero da antinegritude constituem um fio significativo de redes da diáspora. Hortense Spillers, por exemplo (2003: 214-15), adianta que a dinâmica de gênero específica para os sobreviventes da chamada "passagem do meio" estão necessariamente relacionadas, mas ainda não redutíveis às normas de gênero dominantes que sobredetermina não-negros. O argumento é o seguinte. A suspensão das distinções precedido de gênero, e uma violência primordial imposta sobre corpos negros definidos, a presença negra na diáspora. As normas de gênero constituem, assim, um campo pronto para o combate que, por um lado, é muito influenciado por padrões de respeitabilidade hegemônicos, e por outro oferece várias possibilidades que, como eles questionam expectativas normalizadas de desempenho social de gênero, estruturas de impacto de raça e gênero.
A leitura crítica da vida após a morte da escravidão significa trazer as estruturas sociais do passado, e não como um reservatório imutável mesmo, mas como um símbolo cuja energia se dissipa em formações contemporâneas de raça e gênero. Levando em conta o passado no presente e, assim, o presente como reanimação e modificação do passado, as seguintes proposições heurísticas emergem dos ensaios. (Observe como eles se envolvem e, assim, necessariamente modificam, deslocam, um diálogo diaspórico que tende a ser anglófono e centrado em experiências de escritores negros e comunidades nos estados de língua inglesa.) Em primeiro lugar, como Santos, Alves, Rocha e Soares e sugerem, colocado fora simbologia do gênero da fêmea e do macho normatizados, a fêmea negra e macho não habitam área social predeterminada (Spillers, 2003: 228). Isto não é para negar o óbvio: corpos negros são sobredeterminados, continuando a violência (Hartman, 1997: 86). Esta violência expressa e reproduz uma infinidade de 'imagens de controle' (Collins, 1991). Para enfatizar as forças sociais que subjugam corpos de acordo com a constante mudança, no entanto, restringindo, as normas de gênero devem reconhecer as maneiras pelas quais as imagens que controlam a função de estereótipos que são ambos impostos e resistiram. A 'Mãezinha', a 'mãe do bem-estar', e o 'homem negro criminoso' (Russell, 1998), por exemplo, geram expectativas sobre a natureza de uma pessoa e o comportamento com base em sua raça assumida, gênero e sexualidade. Ao mesmo tempo, se opor a tais expectativas é, forçosamente, criar conjuntos alternativos de suposições e conduta. E isso constitui a segunda proposição heurística emergindo dos ensaios: tanto quanto os corpos negros são submetidos a desumanização, eles também realizam contra-narrativas que, embora nem sempre eficaz em negar as normas impostas, no entanto, sugerem possibilidades além do material e limites simbólicos antinegritude de gênero. Esses limites não são apenas sobre o próprio corpo e comportamento, pois eles produzem limites espaciais e, portanto, políticos. O que quer dizer, as possibilidades performativas anunciadas em ensaios deste volume são mais sobre a sobrevivência psíquica quando eles estão prestes a reconfiguração simbólica e experimentação política.

Brasil na diáspora, a diáspora no Brasil


Atualmente, muitos conglomerados urbanos no Brasil podem ser analisados como terrenos de possibilidades em seu interior, embora, e como um sintoma de processos esmagadores antinegros. Redes sociais negras densas e complexas são justapostas à terra que tem sido, talvez, mais ainda, nos últimos anos, um campo de batalha entre concorrentes projetos sociais (por exemplo, Carril, 2006). Geografias negras históricas – evidência de um apartheid atual (Oliveira, 2007; Rolnik 1989) definido pela violência, a exclusão, bem como a presença desproporcional de negros – tornou-se o foco principal da ocupação militar e policial sem precedentes. Aniquilar as gangues de tráfico de drogas abrigadas nessas áreas é o objetivo oficial.
O Brasil, de forma mais ampla, constitui um caso interessante dado o atual contexto econômico marcado pelo controle da inflação, aumento do salário mínimo, e as políticas públicas, como o Bolsa Família que foram eficazes na transferência de renda para famílias carentes. Tendo em conta que os negros – que no Brasil inclui pretos e pardos, de acordo com o censo – são desproporcionalmente representados entre os pobres, não é de admirar que eles foram os principais beneficiários de tais políticas redistributivas. No entanto, um foco crítico sobre antinegritude de gênero torna possível levantar questões sobre a viabilidade da presença negra no Brasil, mesmo em um contexto de aparente elevação social do negro. Por exemplo: em 2007, em 26 dos 27 estados brasileiros, a taxa de mortalidade por homicídio de negros era maior do que a taxa para os homens brancos, e a assimetria teve magnitude exponencial: no estado da Paraíba, por exemplo, foi 1.181,4 por cento superior; 806,9 por cento maior em Pernambuco. No estado do Rio, essa taxa foi de 130,0 por cento maior para os negros do que para os brancos (Paixão, 2010: 255, 256). Mais revelador, talvez, é o que é chamado de "homicídio por intervenção legal", ou seja, os homicídios cometidos por indivíduos que trabalham para o Estado, especialmente a polícia. Não obstante os padrões de subnotificação documentadas em relação a tais homicídios, entre 2001 e 2007, têm os negros representando 61,7 por cento do seu total, a 64,5 por cento em 2007 (Paixão, 2010: 259). Os negros estão sobre-representados nos índices de morte violenta, morte evitável por doenças, acesso vetado à assistência médica e outros indicadores que sugerem padrões de longa data de exclusão (Paixão, 2010: caps 2, 4). Uma hipótese que emerge das obras de Santos, Alves, Rocha e Soares é que, ao passo que atualmente os negros experimentam ganhos econômicos sem precedentes, eles também são desproporcionalmente vitimados pela negligência do Estado (nas esferas da educação e saúde, por exemplo) e, mais incisivamente, a violência. Enquanto a elevação econômica sugere um grau de assimilação em um mercado consumidor em expansão, o Estado negligência e a violência indica uma disposição estrutural antinegros de longa duração que põe em questão a possibilidade de plena integração do negro e sua cidadania. Em debate é se, e em que grau, a vida negra é viável na política brasileira.

Configurando o cenário mundial

Para contextualizar os problemas aos quais os ensaios deste volume se endereçam, vamos nos focar brevemente sobre os recentes acontecimentos do Rio de Janeiro. Alves é o único autor nesta coleção cuja pesquisa não se baseia principalmente no Rio de Janeiro. No entanto, suas percepções sobre lutas de São Paulo sobre o território sugerem uma cornucópia macabra de semelhanças e continuidades.
Depois do infame massacre de 2007 no Complexo do Alemão, uma classe trabalhadora, majoritariamente uma área de negros no noroeste da cidade, quando 19 pessoas foram mortas em uma única operação policial, a região metropolitana do Rio de Janeiro testemunhou uma onda sem precedentes de violência, aparentemente atos coordenados de desafio contra o Estado e a sociedade civil. A queima de ônibus, caminhões e automóveis de passageiros; tiros em oficiais da polícia, incluindo a derrubada de um helicóptero da polícia no Morro dos Macacos, em outubro de 2009 (22 pessoas foram mortas nessa operação), e até mesmo explosões em áreas turísticas (Salles, 2007) – todos marcaram a cidade como cenário nacional em que o Brasil do projeto modernizador emergente é testado.
Em 2 de outubro de 2009, o Rio foi anunciado como o anfitrião dos Jogos Olímpicos de 2016. Respondendo às preocupações de segurança expressas durante o processo de seleção hospedeira da cidade, o governador do estado do Rio, Sérgio Cabral, sinalizou sua determinação de assegurar o controle social através da contratação de Rudolph Giuliani, ex-prefeito de Nova York, como Conselheiro de Segurança dos Jogos. Enquanto Giuliani teve muito de sua aprovação municipal e nacional a partir de sua postura de tolerância zero contra o crime, é também sabido que, entre a população negra da cidade, alguns administradores já ultrapassavam o seu nível de desaprovação (Powell, 2007). A brutalidade do Departamento de Polícia de Nova York empregou sobre membros de comunidades carentes, e especialmente sobre o negro, foram notoriamente exemplificados no assassinato de Amadou Diallo: em 1999, no Bronx, ele foi baleado 41 vezes por quatro policiais à paisana. Mais cedo, em 1997, Abner Louima foi brutalizada e sodomizada com uma alça quebrada do êmbolo de um banheiro por policiais no Brooklyn. Diallo era um imigrante da Guiné, e Louima é originalmente do Haiti, sugerem ressonâncias diaspóricos profundas e amplas. Estas ressonâncias reafirmam o lugar necessário que o Estado da nação brasileira ocupa nestas teias de inflexões de gênero e de raça, impactando e impactado por lutas sobre direitos para a cidade e, finalmente, a propriedade da terra.
Muitos dos fuzileiros navais brasileiros empregados nas operações policiais no Rio e em outras cidades brasileiras são veteranos do Haiti. O Brasil lidera o componente militar da Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti, em operação desde 2004. Missões militares não ao contrário de quem trabalha no Rio já mataram dezenas de pessoas no Haiti em várias ocasiões. Por exemplo, em 6 de Julho de 2005, pelo menos 26 pessoas foram mortas em um atentado bem sucedido em Emmanuel "Dred"[2] Wilmer, também conhecido como Dread[3] Wilme, e quatro de seus seguidores mais próximos. Wilme era abertamente hostil à ocupação militar da ONU de seu país e se opôs à derrubada do presidente constitucional Jean-Bertrand Aristide (Delegação Estadunidense do Trabalho e Direitos Humanos, 2005). A importância desses eventos diaspóricos não pode ser exagerada, pois eles sugerem linhas de continuidade entre os territórios separados pela distância geográfica, mas aproximaram-se devido à utilização frequente de ocupação policial-militar e táticas de pacificação contra os civis, os locais familiares de exclusão negra do Estado-nação, e a super-representação quase esperada dos corpos negros como vítimas da violência letal. Ao invés de comparações diaspóricas, então, o que as lutas violentas no Rio sugerem é um conjunto profundo e contínuo, e reveladora das relações entre as formas em que se manifesta a antinegritude de gênero em e através de chamadas missões de pacificação. O Rio torna-se interessante, não porque ele é único, mas porque oferece uma variação de um aparato repressivo que é diaspórico em seu alcance e efeitos.
No Rio de Janeiro, essa sequência de cinco anos de confrontos mortais frequentes oferece uma janela para um padrão histórico de longa duração, que remonta a pelo menos o estabelecimento de assentamento informal similar, na virada do século 20 (Moreira, 2006; Perlman, 2009). Os ensaios neste volume nos lembram que a negritude tem um papel central na definição do escopo, letalidade e intensidade prolongada de tais conflitos – conflitos que são tanto para a tomada do controle de territórios preparados para combate ao passo que eles estão prestes a defender em espaços da cidade do Rio de Janeiro um projeto nacional modernizador que parece ter pouca, ou nenhuma, tolerância para o controle autônomo da terra de negros e, em última instância, a ação política autônoma, negra.




[1] Endereço para correspondência:
João H. Costa Vargas, Departamento de Estudos da Diáspora Africano e Africano da Universidade do Texas, Austin, TX 78712, EUA. Email: costavargas@mail.utexas.edu.
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[1] Creio que aqui o Vargas trabalhe um conceito, dentre tantos outros perceptíveis em sua obra, de Paul Ricoeur que expõe, grosso modo, a ideia das intervenções sociais podendo ser narrada pois é e "sempre já" está simbolicamente mediada quer seja por sinais como por regras ou normas (Nota do Tradutor).
[2] O termo dred ou dread, o primeiro seguramente derivando do segundo como corruptela, significam em inglês O pavor, o medo, horror. (Nota do tradutor)
[3] Idem (Nota do Tradutor)

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

História contemporânea e proposições.


História Contemporânea: Abordagens e métodos para aulas no Ensino Médio


Wilson Oliveira Badaró



Resumo: O presente texto apresenta um resumo acerca dos conteúdos relacionados com a disciplina de Laboratório de Ensino de História Contemporânea trazendo conjunturalmente uma proposta metodológica para as atividades docentes em nível de Ensino Médio. Tal trabalho visa apresentar articulações pedagógicas dos conteúdos vistos no curso de Licenciatura Plena em História e os conteúdos cobrados como parte das matrizes curriculares do Ensino Médio e Fundamental. O propósito da produção é também obter a aprovação na disciplina em questão após anuência do ministrante da disciplina, professor doutor Vinícius Rezende.




Texto eleito: HOBSBAWM,             Eric J. “A queda do liberalismo”. In: Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras, 1995, pp. 113-143.

Introdução


O texto inicia sua apresentação com duas citações que induzem seu leitor a perceber como as ideias de um líder político tomaram dimensões dogmáticas e, por muitas vezes se materializaram em seus alvos de convencimento por haver tomado proporções axiomáticas levando-nos a pensar como o conceito de dominação se aplica aqui e se afirma. Evidentemente, se compreendermos a dominação, do ponto de vista mais conceitual, como a realização das vontades de alguém sobre outrem que não a pessoa proponente desta vontade, então, vemos que na segunda citação do texto de Hobsbawm, as vontades do Fürher foram devidamente materializadas e cumpridas neste relato. Acredito que esta introdução ao texto faça fronteira bastante tênue com a temática do nacionalismo, e que as ideias propagadas dentro dos processos de construção da identidade nacional – como no ufanismo de Afonso Celso, por exemplo – , façam, de fato, alguma conexão com os processos de convencimento usados em conjunto com o conceito de dominação. Contudo, esta discussão mais teórica não é o objetivo deste trabalho e pode bem ser discutido em outro trabalho.
A discussão se inicia com exposição de valores oriundos originalmente das ideias da ilustração (século das luzes) onde a racionalidade era a base para todas as ações. Estes valores eram voltados para a racionalidade que, por sua vez, colocavam o homem no centro das discussões e pretendiam avançar, sendo este avanço entendido como uma digressão da pretensa barbárie obtido por um cumprimento mais detido das leis e normas sociais vigentes visando um melhoramento geral na condição do homem.
Hobsbawm demonstra como estes valores se espraiaram rapidamente fundados em constituições que garantiam amplamente direitos humanos, liberdades e ações mais democráticas no sentido da democracia, sendo eles importados de país para país, pois representavam uma síntese, no campo político, dos ditos avanços nas condições humanas. Não obstante, tais valores não eram uma unanimidade, sobretudo, entre as
forças tradicionalistas como a Igreja Católica Romana, que ergueu barricadas defensivas de dogmas contra as forças superiores da modernidade; por uns poucos rebeldes intelectuais e profetas do apocalipse, sobretudo de ‘boas famílias’ e centros estabelecidos de cultura, de certo modo parte da civilização que contestavam; e pelas forças da democracia, no todo um fenômeno novo e perturbador (HOBSBAWM, 1995, p. 114).
Ou seja, diante da realidade de uma grande maioria de iletrados a falta do acesso à informação mais geral era facilmente explorada por intelectuais e influentes personalidades do cenário político e religioso e, segundo Hobsbawm, a disputa era menos política que econômica, contudo, o parlamentarismo representativo se difundia com maior notoriedade entre os países independentes e se excetuarmos os “fósseis políticos jurássicos isolados” (HOBSBAWM, 1995, p. 114) e outros que dispunham de leves elementos que indicavam alguma imersão nas ideias liberalistas. Contudo, conclui que “um terço da população do mundo vivia sob domínio colonial” (HOBSBAWM, 1995, p. 114).
Nesta altura, o autor apresenta elementos que nos levam a entender que apesar das ideias do liberalismo estarem se difundindo com fluidez, a democracia não acompanhava o passo em concomitância. Dito de outra forma, nem todos os países que dispunham de uma inclinação liberal era também democrático, uma vez que “a lista de Estados consistentemente constitucionais e não autoritários no hemisfério ocidental era curta” (HOBSBAWM, 1995, p. 115), demonstrando uma grande oscilação das tendências políticas entre a esquerda e a direita.
Hobsbawm precisa que pelo fato de boa parte do mundo estar sob regimes coloniais e não liberais e, sobretudo, como em outras partes do globo, o liberalismo entrou em descenso e com maior ênfase após a assunção de Hitler ao poder e como, gradualmente, este descenso só se acentuou até 1944 (HOBSBAWM, 1995, p. 115).
Trata o autor de frisar como a resistência e oposição ao liberalismo emanavam basicamente da direita e como as tensões em torno deste ideário liberal se configuraram entre estes dois polos da política mundial e passará a partir daqui a discutir como o conceito de fascismo é por ele visto. Dentro destas discussões, Hobsbawm inclui os limites e alcances do conceito, assim bem como sua real relevância no tocante a sua aplicabilidade em outras realidades que não a italiana e a teutônica.
Parece-me aí que o autor tenta veementemente separar a ideia conceitual totalitarismo do conceito de fascismo, pois, segundo ele, nem todos os regimes totalitaristas que buscaram derrubar “os regimes liberal-democráticos” (HOBSBAWM, 1995, p. 116) eram necessariamente fascistas. Contudo, apresenta uma leitura propondo que o “fascismo, primeiro em sua forma original italiana, depois na forma alemã do nacional-socialismo, inspirou outras forças antiliberais” (HOBSBAWM, 1995, p. 116), forças estas que corroboram o processo de declínio do liberalismo usando como modelo algumas formas do fascismo.
Estas forças, em todos os lugares onde elas prevaleceram se opunham à revolução social, pois ela representava a transformação indesejada – sobretudo para os direitistas – da “ordem social” e, segundo Hobsbawm, as forças coercitivas, militares e policiais, por exemplo, tinham o melhor momento para a ação – como vimos aqui no Brasil este fenômeno suceder.
Em sequência, o autor apresenta as tendências políticas da direita e fazendo uma taxonomia de como estes regimes autoritários e conservadores, e seus respectivos representantes, mantinham as afinidades com o fürher e ou, também, suas diferenças, – caso de Churchil contrariando a expectativa Tory. No primeiro tipo ele apresenta a falta de ideologia peculiar, mas apenas alguns elementos comuns com o fascismo.
O segundo tipo, chamado pelo autor de “estatismo orgânico”, se diferenciava pela resistência ao liberalismo e sua característica individualista e “a ameaça do trabalhismo e do socialismo” (HOBSBAWM, 1995, p. 117), reforçando as antigas leis mecanicistas de um funcionamento social meramente orgânico e estratificado, onde a ordem de cunho estamental era aceita e difusa. Contudo, ela mais se aproximava dos tipos autoritários e burocráticos que de uma utopia a lá Thomas Morus.
Dentro desta discussão, Hobsbawm afirma que a Igreja não era fascista apesar de ser altamente reacionária, e que por muitas vezes fora ela vista como opositora deste fascismo, ainda que o fascismo tenha se utilizado em grande parte da estrutura tradicionalista da Igreja para fundamentar e cristalizar suas premissas. Obviamente, a Igreja enquanto instituição plural e de amplas proporções contou com outras vertentes que se aliaram ao fascismo – integristas – que dispunham como elemento comum de suas afinidades do ódio pelo iluminismo, contudo, tais junções, não podem ser generalizadas ou projetadas para a Igreja como um todo. Estas rupturas ideológicas dentro da instituição católica gerou disputas, resistências e colaborações que modificaram em muito o perfil desta instituição desde então. Estas mudanças se traduziram em intervenções sociais da Igreja que foram bastante favoráveis à causa trabalhista (HOBSBAWM, 1995, p. 119).
A partir deste momento, o autor apresentará as ligações do fascismo com o nazismo e defenderá a ideia de que, sem o fascismo, o nazismo, em seus moldes conhecidos hoje, seguramente não seria possível, assim como, sem o nazismo, o fascismo não teria tido a projeção que teve em virtude dos impactos causados pelo primeiro. Hobsbawm aponta como houve uma troca intensa de práticas, ideologias e apoio entre estes dois regimes e as especificidades que caracterizaram ambos dentro do percurso histórico, tais como: racismo, antisemitismo, anticomunismo, antiliberalismo, nacionalismo forte etc. (HOBSBAWM, 1995, pp. 120-121)
Hobsbawm propõe que a diferença básica entre a direita que era adepta do fascismo e a não fascista se resumia na forma da mobilização das massas. (HOBSBAWM, 1995, p. 121) Enquanto os fascistas abraçavam a ideia – quase populista, senão o era – de discursos em praças públicas, aproximação do povo através de retórica que descrevia os anseios do povo, focando sua retórica na manutenção das tradições prezadas pelas massas sem recorrer a bastiões das tradições como a Igreja ou a aristocracia, os seus concorrentes não o faziam.
Como uma das bases do nazifascismo jazia no racismo, a eugenia não tardou a surgir como fundamento da superioridade e da base para uma população melhor e mais forte, e em boa parte, a tecnologia disponível naquele momento, fez o resto do fomento.
 Hobsbawm irá apresentar a mobilidade demográfica como um fato extremamente pertinente daquele momento histórico para entender os princípios básicos da xenofobia tão difundida na Alemanha e, sobremodo, nos EUA.
Evidentemente, o próximo passo será, para o autor, apresentar elementos que nos façam compreender as razões históricas dos ressentimentos germânicos em relação aos judeus. A aderência dos judeus aos ideais iluministas e sua onipresença – a questão da notoriedade e visibilidade destes em lugares de destaque no comércio e cargos públicos, na visão dos germânicos, expropriando-lhes de atividades e lugares que deveriam por eles ser ocupados (além de um ideário mítico relacionado a crenças medievais de práticas judaicas) – foram o suficiente para mover uma raça perfeita contra uma raça indesejada historicamente em vários lugares do globo.
Partindo destas bases, os progroms se espraiaram de forma pandêmica pelo mundo pangermânico como reforço do já instalados antisemitismo e racismo, e obviamente, tais mecanismos de exclusão serviam, em contrapartida, como autoafirmação do crescente nacionalismo que andava a passos largos com o apoio dos intelectuais.
Acordando com Hobsbawm, a participação das massas em favor do nazismo foi notória, “se estabeleceram governos fascistas com legitimidade pública, como na Itália e Alemanha” (HOBSBAWM, 1995, p. 125). Obviamente, este apoio em massa da população a um regime fascista como na Alemanha, segundo o autor, está relacionado com o fato da Grande Depressão. Ou seja, diante de um grande caos econômico, quando muitos se desesperaram, a transformação da economia veio por meio de um governo com estas características – a fascista, pois, segundo Hobsbawm
do mesmo modo como dinamismo dos comunistas exerceu uma atração sobre a esquerda desorientada e sem leme após 1933, também os sucessos do fascismo, sobretudo depois da tomada nacional-socialista da Alemanha, deram a impressão de que ele era a onda do futuro. (HOBSBAWM, 1995, p. 127)

Deste ponto em diante, o autor nos apresenta o que parece impossível, sendo para ele bastante nítido que o fascismo é um movimento liderado por direitistas e as tendências de revolução social como um movimento de esquerda, o autor aceita que Lênin tenha inspirado Hitler e Mussolini, contudo, não admite teses que aproximem a inspiração do holocausto  haver partido das mazelas também perpetradas à sociedade pela Revolução Russa. O autor apresentará as questões militares do pós guerra (I Grande Guerra) e da intencionalidade política velada na utilidade de contraposição do fascismo ante os movimentos de revolução social. (HOBSBAWM, 1995, p. 128) Assim, o autor refuta todas as desculpas teóricas e hipotéticas que tentem aproximar ambos os fenômenos sociais dos lados opostos da política.
Hobsbawm se preocupa ainda em demonstrar, para efeito de consolidar a ideia de como o fascismo deu certo, que a anterioridade das bases fascistas na população, mesmo sem o domínio ou o controle, exerceram influência sobre a população como que preparando-a antecipadamente para os modelos que tendiam a serem implantados posteriormente. Aliado a isto, a queda de antigos líderes e poderes abre caminho ao fascismo (HOBSBAWM, 1995, p. 129).
Dessa forma, Hobsbawm propõe que Hitler não tenha tomado o poder, mas apenas tenha chegado até ele por “conveniência” porque todo o cenário era favorável à isto: população descrente, economia fraca, Estado abalado etc. Seguindo esta discussão, ele desconstrói mais duas teses sobre uma pretensa Revolução fascista e um capitalismo monopolista (HOBSBAWM, 1995, pp. 129-130).
Mais adiante o autor irá discutir as especificidades do fascismo italiano e também do alemão, apresentando detalhes dos bons resultados econômicos do fascismo em virtude de sua postura patronal diante do capital eliminando “os sindicatos e outras limitações aos direitos dos empresários de administrar sua força de trabalho” (HOBSBAWM, 1995, p. 132). Conjuntamente, Hobsbawm nos dá algumas informações sobre as condições favoráveis do Estado alemão para prosperar como: seu tamanho, sua localização geográfica, e os potenciais econômico e militar (HOBSBAWM, 1995, p. 133).
Após tais apresentações o autor faz uma analogia entre Rússia e Alemanha que, seguramente, ele achou cabível. Que ambas, em seus propósitos e propostas foram bem sucedidas historicamente. Logo em seguida apresenta o que esboçou no início da discussão. Como o fascismo teve repercussão e teve alguns de seus elementos constitutivos em todo o mundo, salvando-se as devidas proporções e especificidades. Apresenta como alguns elementos estavam presentes no Japão, mas, sem que esse país fosse necessariamente fascista (HOBSBAWM, 1995, pp. 134-135), e fazendo interessantes colocações e provocações sobre as Américas, mas insuficientes para que as tomemos como discussões profundas (HOBSBAWM, 1995, pp. 136-137).
Por fim, Hobsbawm dá ênfase a ideia de separação objetiva entre nacionalismo e fascismo, tratando de expor características de um e de outro, de como no fascismo alemão, por exemplo, o arianismo era algo importante na constituição de uma identidade fascista da política social e de como o nacionalismo, em alguns países, poderia entravar o fascismo.
Após estas discussões, ele fará um resumo de tudo o que fora discutido e reafirmará o papel central que a Grande Depressão teve para o sucesso do fascismo e como a fragilidade do liberalismo também colaborou para este desfecho, apresentando quatro condições que apresentavam estas fragilidades: a questão da legitimidade; compatibilidade da composição étnica popular; da burocratização (parlamentos) que deveria facilitar, mas acabou entravando a máquina estatal democrática; e, finalmente, a questão da riqueza e da prosperidade. O autor acredita que a democracia se demonstrou ineficaz e apenas serviu de aparelho de conciliação de grupos antagônicos, e por assim ser, sua credibilidade e fiabilidade já não eram tão claras na segunda metade do século XX.
No geral, o resumo do texto foi satisfatório, mas alguns parágrafos não foram bem elaborados, conforme destaquei acima.

Proposta metodológica para a aula de Ensino Médio


A proposta para trabalhar os conteúdos traz novas ferramentas para as aulas, fazendo uso de novas linguagens, mas que tanto pode trazer métodos inovadores quanto preservar os métodos tradicionais com o fim de se obter bons resultados com estas ferramentas, desde que criativamente utilizado. Por sinal, para aqueles que acreditam ser uma perda de tempo o uso de jogos eletrônicos, MMORPG (Multiple Massive Online Roling Playing Game ou Massive Multiplayer Online Role-Playing Game: Jogos Online para Múltiplos Jogadores de Representação) e RPG (Role Playing Game: Jogo de Representação de Personagens) para a educação, fora veiculado no sábado do ano de 2013 em 19 de Outubro, uma matéria especial na emissora de televisão Globo entre as 06:00 e 08:00 da manhã dedicando este período para discutir os usos, limites e alcances desta linguagem/produto da indústria cultural como ferramenta de auxílio aos professores em diversas escolas e na educação como um todo. Assim sendo, proponho esta inovação como ferramenta de auxílio para fixação e compreensão de conteúdos no ensino de História.
Diante desta nova possibilidade dentro do ensino, que se apresenta como uma forma de atrair e prender a atenção dos alunos, pois, estes já estão bastante “conectados” e atentos a estas ferramentas, os jogos aparecem como uma forma real de possibilitar a horizontalização das relações entre aluno e professor. Considerando as problemáticas do tempo real, da hiperconectividade e, sobretudo, diante deste contexto de imediatismo, pode-se ainda, enquanto professor, argumentar junto aos alunos que tal escolha visa evitar a previsibilidade da elaboração de nossas aulas, pois, com um elemento livre de representação como o RPG/MMORPG nunca se pode prever o andamento e os rumos da exposição dos fatos nele contidos, ou, quais aspectos dos fatos nos ateremos para problematizar historicamente.
É ainda interessante, obviamente, que os professores possam fazer um resgate dos jogos eletrônicos e transformar a representação dos personagens históricos dos games numa avaliação bastante rica usando jogos que partem objetivamente de acontecimentos históricos tidos como dados em jogos como: Age of Empire I, Age of Empire II, Age of Empire III, Civilizations I, Civilizations II, Civilizations III, Civilizations IV, Civilizations V, ou ainda Age of Mithology I, Age of Mithology II dentre tantos outros possíveis. O melhor disso tudo é o fator imprevisibilidade pois, uma mínima ideia de qual caminho a aula pode tomar diante de um jogo eletrônico de múltipla possibilidade e representação acaba tornando-se impossível, ao menos para os alunos, mantendo a atenção e interesse constantes de todos eles.

O que é um RPG e um MMORPG? Como posso usá-los em minhas aulas?


Como pudemos ver na discussão anterior, os MMORPG são jogos onde os jogadores além de escolherem “livremente” as características mais aprazíveis de seu personagem optara ainda como gostará de representar seu personagem dentro de um jogo proposto. A diferença básica entre o MMORPG e o RPG enquanto jogos eletrônicos é simples: um possibilita a conexão com uma infinidade de outros jogadores previstos ou não e o outro já dispõe de um número previsto de personagens que irão interagir sendo tal previsão imutável. Mas, repito, observe-se que tal limitação se aplica ao jogo de representação de personagens eletrônicos pois, no jogo de tablado ou de mesa, coordenado por um mestre de jogo humano como mediador dos acontecimentos, as possibilidades, obviamente, são muito maiores.
Dentro desta possibilidade gostaria de apresentar um trabalho que venho acompanhando e tenho percebido resultados espetaculares. Existe uma página de um grupo de estudantes de História do IFBA de Catu voltado para a interpretação de aspectos históricos dentro dos jogos eletrônicos coordenado pelo professor Marcelo Souza Oliveira denominada History Games. Nesta página o professor propõe atividades extraclasse, deveres, faz orientações e percebo que os alunos têm interesse muito maior nas aulas do que vemos entre os colegas acadêmicos… O melhor nisto tudo é a relação que eles estabeleceram com seu professor. Chama-no/tratam-no de “painho”, “fessor”, “mestre” (fazendo alusão ao mestre de jogos do RPG convencional de mesa). O mais interessante é que a coisa tem dado tão certo que acadêmicos como eu, Sandro Augusto Cerqueira Junior e o Professor Doutor Leandro Almeida somos parte atuante e executiva neste grupo onde os debates são ansiados, esperados e realmente requeridos por parte dos alunos. É pensando nesta experiência que eu penso em desenvolver minha aula de contemporânea com tal ferramenta/linguagem para discutir os tópicos da História Contemporânea.

O Plano de aula com metodologia


Objetivos gerais:
Desenvolver nos alunos uma visão crítica sobre as limitações do liberalismo e suas potencialidades e também, sobre as diversas influências do nazifascismo entre os europeus e no mundo, dando ênfase aos continentes americano e africano (Lei 10.639) por serem aqueles que sofreram algumas influências destas correntes ideológicas e políticas. Mas, fazendo alusão à ideia da pureza e singularidade destes fenômenos sócio-políticos em seus lugares de origem: Alemanha e Itália – caso do nazifascismo e suas resistências às ideias liberais.
Justificativa:
Os conteúdos são importantes para se compreender o atual contexto histórico, porque as leis de mercado hoje seguem a uma normatização vista como neoliberal. Ou seja, para compreender o neoliberalismo, é preciso compreender o liberalismo e sua gênese, o países que resistiram a sua implementação e quais as suas razões.   
·         Conteúdos:
O fascismo de Mussolini e de Hitler.
  1. Aproximações e digressões.
  2. Como o nazismo surgiu do fascismo?
  3. Por que o fascismo não seria tão visto sem o Nazismo?
  4. Comerciantes judeus e sua contribuição para na radicalização do racismo e nacionalismo nazista
·         Número de aulas: 08
·         Metodologia:
Para tanto, pretendemos lançar mão do jogo eletrônico de autoria do programador e designer canadense Sid Meier – Civilizations I – que, entre alguns círculos de historiadores é considerado como um par. O jogo apresenta todas as condições para se discutir o materialismo histórico marxista, iniciando o jogo com uma comunidade devidamente sedentarizada, em geral localizada próxima a recursos naturais que serão as bases da sustentação (ou não) da sociedade em questão utilizada pelo aluno jogador. Partindo destes recursos, a sociedade se desenvolve à medida que suas técnicas e tecnologias de extração e processamento destes recursos se desenvolvem forçando assim ao aluno jogador se indagar como em diferentes fases da humanidade os mesmos recursos foram diferentemente trabalhados e utilizados efetivamente. Obviamente, o jogo, com a participação de mais jogadores humanos ou não, chega a um ponto de expansão das sociedades envolvidas forçando-as a entrarem em acordos ou desacordos políticos e convencer a sua sociedade de que as escolhas feitas pelos seus líderes são as mais interessantes e proveitosas possíveis sendo que isto engendrará a felicidade ou a infelicidade da sociedade gerindo e esta é fundamental para o bom andamento do todo social. É justamente neste ponto que podemos trabalhar as relações econômicas do liberalismo, suas premissas e teorias, assim bem como a influência do nazifascismo e sua inter-relação com a queda do liberalismo e destas bases apresentar o desenvolvimento humano no campo político, econômico, cultural e social auxiliado por uma linguagem figurativa como um jogo eletrônico.
·         Problematização:
Como os sistemas políticos das sociedades envolvidas na corrida de dominação, que é no que o jogo se funda para dispor de um nível de competitividade interessante para os jogadores, as analogias entre as diferentes sociedades podem ser feitas, como são diferentes antes de serem dominadas politicamente, culturalmente, ou militarmente por outra nação. Partindo destas observações primárias podemos forçar uma abstração dos processos de influências que Hitler e Mussolini imprimiram em suas sociedades e em outras, assim bem como demonstrar como as ideias do liberalismo foram, em certa medida percebidas em outros lugares que não no seu próprio lugar de origem.
·         Recursos utilizados:
O quadro de lousa, filmes e textos pré-estabelecidos, assim como os trazidos pelos alunos (caso haja pesquisa), computador e projetor.
·         Atividades/avaliações:
Transposição didática dos RPG em peças teatrais retratando personagens históricos com polarização dos desfechos (o que fez o personagem histórico e o que faria o ator representante do papel, no caso um aluno). As avaliações serão processuais e continuadas observando-se a aderência e capacidade interpretativa do(s) aluno(s) sobre os elementos históricos nos jogos propostos e suas analogias com a história formal além das apropriações e projeções que os desenvolvedores fazem no jogo.

Bibliografia



HOBSBAWM, Eric J. Era dos Extremos: O breve século XX: 1914-1991 – São Paulo: Companhia das Letras, 1995.